21 de dez. de 2008


Poder contar todo o seu ouro é sinal de pobreza, e o meu amor chegou a tal riqueza que nem pela metada eu contarei agora.


W. Shakespeare

mulher banana


... pois agora vou apresentar pra vocês a grande novidade desse mercado tão nutritivo: a Mulher Banana. A Mulher Banana, se tivesse um quadril de 120cm, correria três horas por dia numa esteira. Se isso não adiantasse, correria para uma mesa de cirurgia a fim de tirar uns cinco bifes de cada lado, porque ela considera bundão uma coisa muito vulgar. Faria isso por vaidade, pois acredita que, na prática, não faz a menor diferença para os homens se a mulher tem 90cm ou 120cm. Eu avisei que ela é banana. Essa questão da vulgaridade quase a deixa doente. Ela não se conforma de que a rafuagem ganhe tanto espaço na imprensa, incentivando um monte de menininhas a também rebolarem no pátio da escola. Ela morre de vergonha ao ver a mãe da Mulher Melancia dizer para um repórter que sente muito orgulho de ter uma filha vitoriosa. Ela se pergunta: pelamordedeus, não existe ninguém pra avisar essa gente que eles perderam o senso do ridículo? A Mulher Banana é totalmente sem noção, coitada. A Mulher Banana não se dá conta de que há pouco assunto para muito espaço na mídia. Não há novidade que chegue para preencher tanto conteúdo de internet, tanta matéria de revista, tanto programa de tevê, e é por isso que qualquer bizarrice vira notícia. Sem falar que, hoje em dia, tudo é cultura de massa, tudo é passível de análise para criarmos uma identidade nacional. Não, não, não pode ser!! Pode, Mulher Banana. A Mulher Banana, como o próprio nome diz, é ingênua, inocente, tolinha. Ela acredita que o discernimento nasceu para todos e que ser elegante vale mais do que ser ordinária. É boba, mesmo. Não no mercado das mulheres hortifrutigranjeiras, minha cara. Aliás, mercado ao qual você também pertence. Banana. A Mulher Banana ainda se choca com certas imagens, com certas fotos. Não que ela não acredite no que está bem diante do seu nariz (já sondei e não tem parentesco algum com a Velhinha de Taubaté). Ela vê, ela sabe, ela está bem informada. Só que não consegue tirar isso pra piada, não leva na boa, não passa batido: ela é tão banana que se importa!! Aviso desde já que a Mulher Banana não tem empresário, não posa para sites eróticos, não dá entrevistas e muito menos aceita sair de dentro de um bolo gigante usando só um tapa-sexo. Ela é banana. Vai morrer sem dinheiro, só é rica em potássio. E não pense que é movida à inveja. Se fosse, invejaria a bundinha da Gisele Bündchen, que também andou à mostra esta semana e tem um tamanho bem razoável. A Mulher Banana, tadinha, ainda sonha com um padrão estético razoável e um comportamento social menos nanico. Não pode ser brasileira! Mas é, conheço-a como a mim mesma.
Martha Medeiros

...Nα "мµlhєr iηtєrєssαηtє",
α bєlєzα é sєcµηđάriα, irrєlєvαηtє є мєsмσ, iηđєsєjάvєl.
A bєlєzα iηtєrєssα ησs þriмєirσs qµiηzє điαs;
є мσrrє, єм sєgµiđα,
ηµм iηsµþσrtάvєl téđiσ visµαl.
Erα þrєcisσ qµє αlgµéм fσssє, đє мµlhєr єм мµlhєr, αηµηciαηđσ:
- "Sєr bσηitα ηãσ iηtєrєssα. Sєjα iηtєrєssαηtє!"


Nelson Rodrigues

Deixa-me errar...


Deixa-me errar alguma vez,
porque também sou isso: incerta e dura,
e ansiosa de não te perder agora que entrevejo um horizonte.
Deixa-me errar e me compreende
porque se faço mal é por querer-te
desta maneira tola, e tonta, eternamente
recomeçando a cada dia como num descobrimento
dos teus territórios de carne e sonho, dos teus
desvãos de música ou vôo, teus sótãos e porões
e dessa escadaria de tua alma.
Deixa-me errar mas não me soltes
para que eu não me perca
deste tênue fio de alegria
dos sustos do amor que se repetem
enquanto houver entre nós essa magia.


Lya Luft

... querer com mais doçura...


A maturidade me permite olhar
com menos ilusões, aceitar com
menos sofrimento, entender
com mais tranquilidade,
querer com mais doçura.

Lya Luft

Guardei-me...



Guardei -me para ti como um segredo que eu mesma não desvendei. Há notas nessa guitarra que não toquei; há praias na minha ilha que nem andei. É preciso que me tomes além do riso e do olhar, naquilo que não conheço e adivinhei; é preciso que me ensines a canção do que serei; e me cries com teu gesto, que nem sonhei...


Lya Luft

29 de set. de 2008


"E eu me pergunto se viver não será essa espécie de ciranda de sentimentos que se sucedem e se sucedem e deixam sempre sede no fim."

Caio Fernando Abreu
"Tantas você fez que ela cansou
Porque você, rapaz
Abusou da "Regra 3"
Onde menos vale mais
Da primeira vez ela chorou
Mas resolveu ficar
É que os momentos felizes
Tinham deixado raízes no seu penar
Depois perdeu a esperança
Porque o perdão também cansa de perdoar
Tem sempre um dia em que a casa cai
Pois vai curtir seu deserto, vai
Mas deixa a lâmpada acesa
Se algum dia tristeza quiser entrar
E uma bebida por perto
pois você pode estar certo que vai chorar"
Vinícius de Moraes

25 de set. de 2008


"... Como ligar-se a um homem senão permitindo que ele a aprisione?

Como impedir que ele desenvolva sobre seu corpo e sua alma suas quatro paredes?

E havia um meio de ter as coisas sem que as coisas a possuíssem?..." Clarice Lispector
"Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas as vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: Quer-se absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida." (Clarice Lispector)

"CONVÉM NÃO FACILITAR COM OS
BONS, CONVÉM NÃO PROVOCAR OS PUROS. HÁ NO SER HUMANO, E AINDA NOS MELHORES, UMA
SÉRIE DE FEROCIDADES ADORMECIDAS. O IMPORTANTE É NÃO
ACORDÁ-LAS."
Nelson Rodrigues

23 de set. de 2008

" Pois as fêmeas sempre arcaram com a pior parte da espécie humana: parir, perdoar, e varrer a casa." Fernanda Young

Eu sou lúcida na minha loucura, permanente na minha inconstância, inquieta na minha comodidade... amo mais do que posso e, por medo, sempre menos do que sou capaz... trabalho sem salário e não entendo de economizar... nem de energia. Esbanjo-me até quando não devo e, vezes sem conta, devo mais do que ganho. Não acredito em duendes, bruxas, fadas ou feitiços... não faço simpatias. Mas, rezo pra algum anjo de plantão e mascaro minha fé no deus do otimismo. Quando é impossível, debocho. Quando é permitido, duvido. Não bebo porque só me aceito sóbria, como pra enganar a ansiedade e não aposto em jogo de cartas marcadas. Penso mais do que falo. E falo muito, nem sempre o que você quer saber. Eu sei. Gosto de cara lavada... pés descalços, nutro uma estranha paixão por camisetas velhas.... mas há uma mulher em algum lugar em mim que usa caros perfumes, sedas importadas e brilho no olhar, quando se traveste em sedução. Se você perceber qualquer tipo de constrangimento, não repare, eu não tenho pudores mas, não raro, sofro de timidez. E note bem: não sou agressiva, mas defensiva. Impaciente onde você vê ousadia. Falta de coragem onde você pensa que é sensatez. Mas mesmo assim, sempre pinta um momento qualquer em que eu esqueço todos os conselhos e sigo por caminhos escuros. Estranhos desertos. E, ignorando todas as regras, todas as armadilhas dessa vida urbana, dessa violência cotidiana, se você me assalta, eu reajo."

...a dor da gente não sai no jornal...

"Tentou contra a existência do humilde barracão
Joana de tal, por causa de um tal João
Depois de medicada, retirou-se pro seu lar
Aí a notícia carece de exatidão
O lar não mais existe, ninguém volta ao que acabou
Joana é mais uma mulata triste que errou
Errou na dose
Errou no amor
Joana errou de João
Ninguém notou
Ninguém morou
Na dor que era o seu mal
A dor da gente não sai no jornal"
Chico Buarque

21 de set. de 2008

Este quarto ficou grande demais. E eu queria um quarto onde só coubesse o meu corpo, uma casca de concreto ao redor de mim. Eu não queria muita coisa. Eu só queria que as paredes me abraçassem.

A voz do silêncio


Pior do que a voz que cala,é um silêncio que fala. Simples, rápido! E quanta força! Imediatamente me veio à cabeça situações em que o silêncio me disse verdades terríveis,pois você sabe, o silêncio não é dado a amenidades.Um telefone mudo. Um e-mail que não chega.Um encontro onde nenhum dos dois abre a boca. Silêncios que falam sobre desinteresse,esquecimento, recusas.Quantas coisas são ditas na quietude,depois de uma discussão. O perdão não vem, nem um beijo,nem uma gargalhada para acabar com o clima de tensão. Só ele permanece imutável,o silêncio, a ante-sala do fim. É mil vezes preferível uma voz que diga coisas que a gente não quer ouvir, pois ao menos as palavras que são ditas indicam uma tentativa de entendimento. Cordas vocais em funcionamento articulam argumentos, expõem suas queixas, jogam limpo. Já o silêncio arquiteta planos que não são compartilhados. Quando nada é dito, nada fica combinado. Quantas vezes, numa discussão histérica,ouvimos um dos dois gritar:"Diz alguma coisa, mas não fica aí parado me olhando!" É o silêncio de um, mandando más notícias para o desespero do outro. É claro que há muitas situações em que o silêncio é bem-vindo. Para um cara que trabalha com uma britadeira na rua, o silêncio é um bálsamo. Para a professora de uma creche,o silêncio é um presente. Para os seguranças de um show de rock,o silêncio é um sonho. Mesmo no amor,quando a relação é sólida e madura, o silêncio a dois não incomoda, pois é o silêncio da paz. O único silêncio que perturba, é aquele que fala. E fala alto. É quando ninguém bate à nossa porta, não há e-mails na caixa de entrada, não há recados na secretária eletrônica e mesmo assim, você entende a mensagem.

"Porque todas as verdades que nos recusamos a dizer se tornam venenosas." Nietzsche

Não sei com que pernas...

"Eu gostaria de viver com você, mas não foi por isso que vim. A intenção é unicamente deixá-lo saber que é amado e deixá-lo pensar a respeito, que amor não é coisa que se retribua de imediato, apenas para ser gentil. Se um dia eu for amada do mesmo modo por você, me avise que eu volto, e a gente recomeça de onde parou, paramos aqui". Martha Medeiros

...se for verdade, é bala perdida, se for mentira, tiro pelas costas..."


"Quem faz intrigas sobre a vida alheia quer ter algo de sua autoria, uma obra que se alastre e cresça, que se torne pública e que seja muito comentada. Algo que lhe dê continuidade. É por isso que fofocar é uma tentação. Porque nos dá, por poucos minutos, a sensação de ser portador de uma informação valiosa que está sendo gentilmente dividida com os outros. Na verdade, está-se exercitando uma pequena maldade, não prevista no Código Penal. Fofocas podem provocar lesões emocionais. Por mais inocente ou absurda, sempre deixa um rastro de desconfiança. Onde há fumaça há fogo, acreditam todos, o que transforma toda fofoca numa verdade em potencial. Não há fofoca que compense. Se for mesmo verdade, é uma bala perdida. Se for mentira, é um tiro pelas costas."Martha Medeiros

12 de set. de 2008

" sentir alimenta, sentir ensina, sentir aquieta..."

sobre humilhação...

" Durante uma vida a gente é capaz de sentir de tudo, são inúmeras as sensações que nos invadem, e delas a arte igualmente já se serviu com fartura. Paixão, saudades, culpa, dor-de-cotovelo, remorso, excitação, otimismo, desejo – sabemos reconhecer cada uma destas alegrias e tristezas, não há muita novidade, já vivenciamos um pouco de cada coisa, e o que não foi vivenciado foi ao menos testemunhado através de filmes, novelas, letras de música. Há um sentimento, no entanto, que não aparece muito, não protagoniza cenas de cinema nem vira versos com freqüência, e quando a gente sente na própria pele, é como se fosse uma visita incômoda. De humilhação que falo. Há muitas maneiras de uma pessoa se sentir humilhada. A mais comum é aquela em que alguém nos menospreza diretamente, nos reduz, nos coloca no nosso devido lugar - que lugar é este que não permite movimento, travessia?. Geralmente são opressões hierárquicas: patrão-empregado, professor-aluno, adulto-criança. Respeitamos a hierarquia, mas não engolimos a soberba alheia, e este tipo de humilhação só não causa maior estrago porque sabemos que ele é fruto da arrogância, e os arrogantes nada mais são do que pessoas com complexo de inferioridade. Humilham para não se sentirem humilhados. Mas e quando a humilhação não é fruto da hierarquia, mas de algo muito maior e mais massacrante: o desconhecimento sobre nós mesmos? Tentamos superar uma dor antiga e não conseguimos. Procuramos ficar amigos de quem já amamos e caímos em velhas ciladas armadas pelo coração. Oferecemos nosso corpo e nosso carinho para quem já não precisa nem de um nem de outro. Motivos nobres, mas os resultados são vexatórios. Nesses casos, não houve maldade, ninguém pretendeu nos desdenhar. Estivemos apenas enfrentando o desconhecido: nós mesmos, nossas fraquezas, nossas emoções mais escondidas, aquelas que julgávamos superadas, para sempre adormecidas, mas que de vez em quando acordam para, impiedosas, nos colocar em nosso devido lugar."